segunda-feira, 28 de abril de 2008

O Som do Nada

Por isso é que só ele ouviu, pelas tantas, tarde para quem se deita cedo, uma frágil música que entrava pelas frinchas da porta e do telhado, grande silêncio haveria nessa noite em Barcelos para que um simples violino, tocando na sala nobre da Câmara Municipal, com portas e janelas fechadas por causa do frio, e frio não estivesse, assim impunha a decência, pudesse ser ouvido por um velho que a idade ia ensurdecendo.
Velho esse que pelo facto de ouvir uma simples melodia rejuvenesce, virtude da Primavera quando começa a chegar-se aos braços do Verão. Tentando esquecer as sombras da rua, dos rostos daqueles que, tal como ele, são filhos do nada. Esquece e aquece ouvindo o som do violino.
Quando a vida é um nada e o nada já não tem vida, tudo, até o chão que altos e emproados senhores pisam, se torna familiar.
Estendendo a mão, só pede que alguém a aperte para que não se sinta tão só, mas este povo que nada entende, oferece uma simples moeda que nada poderá comprar, pelo menos nada que o velho necessite de verdade.
Pobre velho, no meio de tanta gente, sentindo-se tão só… Procura no fundo do seu poço alguma lembrança que lhe aqueça o coração e a única que encontra é o som daquele violino, numa noite…


Heika Castro

1 comentário:

Anónimo disse...

É bem verdade..é esse o nada que tudo é. E há tanta coisa que as moedas não podem comprar...