segunda-feira, 21 de abril de 2008

'Tamos in

Involuntariamente premi Pausa. Ouvi: “Morrerei em paz: está tudo pago!”. Comecei a imaginar como seria morrer sem saber o que é contrair dívidas (não necessariamente financeiras). Imaginei um moribundo a tentar ultrapassar os últimos minutos, sem continuidade e perto do fim. Não me pareceu muito mau morrer. Talvez quando morrer me entretenha a sonhar como teria sido a minha vida se não tivesse especulado acerca da minha morte, como teria sido se tivesse entrado no autocarro errado e, em vez de Barcelos, tivesse almoçado noutro local. Algures. Não aqui.
Ainda no rescaldo de uma overdose de Bob Dylan, e depois de umas seis horas desde que Sean Riley & the Slowriders actuaram no Auditório da Biblioteca: Harry Rivers ainda não me saiu da cabeça. De qualquer forma, encontrei os The Birds. Cantaram para mim. Convidaram-me a passar pelos 60’s, beber um café e conversar sobre política. Mas não fui: o passe perdeu a validade. Em vez disso, preferi passear, sob a chuva, pelo século XXI ali no InCima Café.
Depois do meu habitual copo de leite com café, desci a rua da Estação, em direcção ao Paraíso. Paraíso. Perdão: Paraíso! Gritos se ouviam down the street. Era o Humphrey Bogard a discutir com um chinês. Encontrei uma conhecida que me contou a história: aparentemente Bogard tinha lá comprado um verniz das unhas para a Lauren Bacall. Desde então Bacall nunca mais tinha tido um orgasmo: agora Bogard queria satisfações. O chinês disse que não era responsabilidade dele, porque, na verdade, o verniz era “Made in Tailândia”, apesar de lá dizer “Made in China”... Pela primeira vez ouvi alguém praguejar em mandarim.
Ontem à noite, antes de ir ao concerto, li o mail que o Paulo Furtado me mandou a confessar que não aguenta mais ouvir Wraygunn, e que o sonho dele era filmar um vídeo para a Mtv inspirado no Like a Virgin. Comentei o facto com a senhora do Top Gun (por sinal o melhor clube de vídeo de Barcelos!) e ela respondeu-me: “Deixe lá, Isabel, neste mundo tudo é possível: imagine só que até o Marcello Mastroianni foi cliente do fisioterapeuta do prédio atrás do Camilo!”. Eu disse-lhe que o meu nome não era Isabel, mas sim Zita. Ela retorquiu: “Mais tarde ou mais cedo descobrirás que nada mudou.”
Sinistro.
Faltam poucos dias para a viagem, porém, não quero ir. Sem esperanças vagueio pelas ruas molhadas da cidade do Poleiro.

Afoguei o Manifesto.



Zita Esquerda de Sá

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