terça-feira, 20 de maio de 2008

Onde a Cidade acaba e a Linha começa

Há uma rua ali em frente que tresanda profundamente. Alguém se esqueceu de a frequentar nos últimos… 40 anos! “Nada que me impressione”, responde-me, em tom ríspido, Benjamim.
Encontram-se em Barcelos diversos pedaços de um futuro estilhaçado pelas curvas, linhas e contracurvas que Nadir Afonso resolveu deixar a gerações vindouras, com ou sem tiques de Egocentrismo desnaturado.
A cidade não existe, é o demónio que beijo nos meus sonhos. Nadir tratou de alinhar e centrar num espaço branco alguma daquela substância que está perdida por entre frinchas industriais ou simples bilhetes comprados numa pacata gasolineira.
“E tu?” é algo que não se pergunta. Não se deve perguntar. Espera-se não ser preciso perguntar! Entretanto, chega O Apocalipse: devaneios citadinos com traçados de ruralidade promíscua, profundo desligar de relações minimamente informais. Que fazer? “Oh Bernardes, deixa esse quadro, passemos ao próximo”.
“Isto é uma ponte”. Sim, é óbvio que isso é uma ponte. “Aquilo é um prédio!”. Sim, também é óbvio que aquilo é um prédio. Mas… repara naquela gaivota por cima do prédio, o jardim por baixo da ponte e o fósforo pousado no parapeito daquela janela, olha!
Sente-se o cheiro do sol que espreita pelas janelas da Galeria Municipal de Arte, aconchegando-se na criação que convida ao júbilo do recorte, a tesoura ou x-acto, não das próprias telas, mas dos efervescentes “percebedores” de tudo ou de coisa nenhuma. Leninegrado e outras “Fluorescences” cidades posaram para que Nadir Afonso as retratasse, “As Amantes de Lúcifer” lutaram entre si para decidir qual seria a primeira a ser pintada, porque não olhar uma segunda vez?
Um risco na vertical ali, outro risco na horizontal aqui, o livre-arbítrio começa a ser deixado para trás e é o próprio quadro que nos ensina “o que ver a seguir”. É matemático, doa por onde doer, pinte por onde pintar. Convido a que algumas perspectivas de Nadir Afonso, no que diz respeito à criação de uma obra de arte, sejam analisadas. Este flaviense mostra que não é apenas um pintor. È um pintor que reflecte sobre aquilo que faz, como o faz e porque o faz, algo que se revela perspicazmente saudável, em tempos em que um vulgar cozinheiro se pode tornar num baterista reconhecido em todo o mundo.
“Então, vamos?”, questiona. Já vou, já vou. Um último olhar e reparo que Nadir “ morará em Barcelos até ao próximo dia 29 de Junho. Bom proveito, pois a mim uma antiga e familiar cidade me espera lá Fora.



Jorge Marques

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